segunda-feira, 29 de abril de 2013

Estação...


As estações são assim, caso sejam de comboios ou de autocarros, de aviões ou até de barcos. Tendem sempre a ser sítios isolados, solitários, onde uma pessoa se encontra talvez consigo mesmo, ou tao somente só consigo mesmo. Nunca se tem bem a noção se é dia ou noite, se é de manhã ou se já se alcançou a tarde.
Naquela noite, supondo que seria noite, a estação de comboio, supondo que seria uma estação de comboios, estava ainda mais solitária. Deserta era o termo correcto se não contarmos com pombos, ratos e baratas que se escapavam a medida que os meus passos sonoros quebravam o silêncio que cobria a cidade. As linhas paralelas, aquelas longas vigas de ferro, eram ainda mais escuras do que haviam sempre sido, prolongando-se para lá do oásis de luz, luz morta da florescência que somente se pode chamar de luz por se opor as trevas que se estendiam para montante e jusante do assento que eu tomava. Assento frio, como tudo era frio naquela noite, o vento vinha de norte e entrava de rompante levando pelo ar solitárias folhas de jornal velho que com desproposito me vinham bater nas pernas.
Ali estava, com frio, por fora e por dentro, com a certeza que as linhas eram rectas, embora ao meu olhar se assemelhassem a duas grandes curvas, curvavam nos aguçados gumes de um destino ausente, de um futuro que fugia do espaço que era aquela estação….Para trás ficava o escuro passado, para a frente as trevas do futuro. E o vento, esse fustigava cada vez mais, com cada vez mais violência aquela cara, que ficando cada vez mais fria sentia cada vez mais o gelo que lhe feria os olhos que se iam deixando mergulhar em pequenas gotas de água salobra.
estava ali, prostrado, frustrado, perdido…e como alto se ouvia o relógio a passar os segundos que eram longos minutos.
No fundo estações são assim, locais de espera, de longas ou curtas esperas, de esperas de esperança ou de somente espera…
E como negras eram aquelas linhas, paralelas, rectas sem se cruzarem…seguindo, distando a medida certa da bitola, somente a distância de uma bitola, de um metro e qualquer coisa…para sempre condenadas a não se cruzarem.
E o vento trazia o som, o distante som de um comboio que vinha, que surgia do lado do passado, iluminando as linhas que faiscavam pelo forte foco, que estremeciam, vibraram sobre as rodas que freavam a longa composição que irrompia como uma bolha de ar, ar quente.
Parou na minha frente, as portas abriram-se na minha frente, um corredor de luz, de luz viva, de calor…um tapete de luz.
Levantei o olhar, olhei…e não me mexi…
Com um ruido seco as portas fecharam-se, com um baque enorme e ensurdecedor, a luz ficará de novo fria, a máquina apitou, e começou a mexer-se, a andar, lentamente, a ganhar velocidade, levantando o ar, levando consigo o ar quente, relançado o frio sobre o banco onde me sentará. O ruido afastou-se, foi para frente, rumo ao futuro, tornou-se um ruido surdo, afastado, longínquo…
O vento frio voltava, mais forte, o silencio voltava, aconcheguei a velha camisola ao corpo, enrolei-me sobre mim mesmo, deitei-me no banco frio de ferro…e fiquei a espera…     

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